quarta-feira, 11 de março de 2015

A volta pela passagem de Drake

Os dias de volta foram mexidos como os de ida, mas pelo que todos falaram, não muito mexido. Durante estes dias tivemos algumas palestras interessantes.

A primeira foi sobre o Tratado da Antártica, basicamente um acordo de cavalheiros para manter o continente sem exploração para fins comerciais e sem disputas territoriais para soberania. A semente do tratado veio no século XVIII, mas o arcordo propriamente dito só foi alcançado por diversas nações mais tarde, em 1959. É entusiasmante que num continente, países possam conviver em paz respeitando regras e até cooperando.

Obviamente não há necessidade de disputa por recurso algum para a sobrevivência, já que tudo vem dos países de origem, mas é algo que nos mostra que os seres humanos não necessariamente tem de se definir por conflitos. Há, inclusive, cooperação científica entre países que em outros lugares estão em disputas. A comunidade científica tem objetivos mais nobres que disputas políticas. Nem sempre é assim e nem todos os cientistas pensam assim, mas há trabalho em conjunto.

O acordo está por ser renovado e acho importante que todos nos engajemos nesta batalha. É algo que precisamos manter e tomar como exemplo para outras áreas da humanidade. Quanto mais preservarmos o planeta, maiores chances temos de sobreviver como espécie. E isso não é demagogia. A terra é basicamente uma bola de magma com partes transformadas em pedra. Isso sobrevive a muita coisa, falta de comida, falta de oxigênio, água, explosões atômicas. A gente é que precisa tomar cuidado.

A palestra da tarde foi sobre fotografias. Preciso fazer um curso básico para entender como usar minha câmera, ela não é daquelas que trocam lentes, mas dá todas as possibilidades de mexer nos parâmetros. É um primeiro passo para pensar em comprar algo mais avançado no futuro.

No dia seguinte tivemos uma palestra sobre o Cabo Horn e logo depois um vídeo feito por um marinheiro em sua travessia neste lugar do planeta. Não só fez a travessia como a fez num navio movido a velas. As pessoas se aventuravam de maneira quase que inconsequente. A narração é feita pelo mesmo marinheiro que filmou a passagem. Ele comenta que o importante era entregar a carga no destino final. Não é difícil constatar o papel da ambição na exploração de toda a terra.

Como espécie chegamos a diversos lugares, muitos perigosos, baseado somente na ganância. Ela teve um papel primordial, mas já podemos substitui-la pela curiosidade científica ou pela busca da melhoria de qualidade de vida de mais pessoas no planeta. A nossa espécie provavelmente não sobreviverá se continuarmos neste ritmo.

A viagem foi realmente uma experiência incrível. Tenho a tendência de querer fazer mais viagens pela natureza pelos próximos anos, ao invés de visitar cidades. Mas isto é uma tendência e precisa ser confirmada. Já de volta ao Rio, penso em diversas possibilidades. Aguardemos para ver onde a curiosidade me leva!

Data:18/02/2015 e 19/02/2015

terça-feira, 10 de março de 2015

Deception Island: Baily Head e Telefon Bay

Como em nossa viagem perdemos um dia com o reparo do navio, o último dia no sul teria de ser bem aproveitado, por isso o líder da expedição, Alex, armou uma operação para toda a manhã. Acordaríamos bem cedo, 5:00 para visitar a Baily Head e depois iríamos fazer uma caminhada pela Telefon Bay e visitar um vulcão ativo na Antártida.


A primeira parte do processo foi fácil, dormir cedo para acordar cedo. Os dias são tão cansativos que é comum irmos para o quarto tirar cochilos enquanto o barco se reposiciona, dormir cedo então viria em ótima medida. Acordar cedo tem suas vantagens, vimos o primeiro nascer do Sol da viagem inteira.



Pouco depois recebemos a notícia que não conseguiríamos desembarcar em Baily Head, mas ao invés disto, faríamos apenas uma excursão com os botes. Logo na saída do barco vimos algumas rochas que se erguiam do mar, perto de uma escarpa que se conectava com a praia. O local que visitaríamos tinha uma colônia de pinguins enorme, estimam em 60.000 casais, o que contabilizaria 120.000 indivíduos. Se somássemos os filhotes e os solteiros, segundo nosso piloto, que é um biólogo da Costa Rica, teríamos algo em torno de 300.000 pinguins.

Uma foca loira.

Pinguins tentam aprender a nadar enquanto são levados pelas ondas.
O mar estava entrando alto na praia, aliás, foi por este motivo que não conseguimos desembarcar. Mas também foi por isso que vimos cenas engraçadas de pinguins sendo varridos pela água para dentro do mar. Estes pinguins eram novos e estavam pela primeira vez tentando nadar. A falta de experiência não somente os puxa para dentro do mar quanto os deixam mais vulneráveis a predadores. Encontramos com alguns mortos pelo caminho. Algumas aves estavam fazendo proveito da situação.



De lá nos deslocamos, ainda nos botes, para a Telefon Bay. Esta baía tem o formato redondo e apenas uma entrada estreira. A entrada é mais estreita do que mostra o mapa, porque há uma pedra entre as duas paredes de entrada.



Nesta baía localizava-se uma estação de baleeira. Depois de capturadas, as baleias eram trazidas para o local onde processava-se a mesma. Óleo era extraído da baleia e passava pelo processo de transformação. Antes da eletricidade as casas e ruas no mundo eram iluminadas por lamparinas, e, até a descoberta do petróleo, o combustível utilizado era o óleo de baleia. Com esta informação conseguimos ter o tamanho da importância desta indústria no passado.



O que pudemos ver foi a ruína desta estação de tratamento, já que duas erupções cobriram boa parte do que era uma estação maior. O navio veio nos buscar já dentro da baía, aguardamos do lado de fora e bastante gente estava sentindo o frio.




Os botes se posicionaram para que as pessoas entrassem no barco, nosso piloto, costa riquenho ultrapassou todos que já estavam na fila e fomos o primeiro bote a desembarcar. Falei um "viva a América Latina", no que o piloto riu, obviamente entendendo tudo. Ele não deve nem notar o que fez e o motivo de nossos países não protegerem o cidadão.

No café o John, que estava morrendo de frio, usou a torradeira como aquecedor de mãos. Algumas pessoas fizeram o mesmo. Pouco tempo depois iríamos para o mar e por isso não abusei no café da manhã. O plano era fazer uma caminhada até bem próximo de um vulcão na Deception Island e depois seguir visitando outras crateras.

Havia uma neblina tão espessa que os planos foram mudados no caminho até a praia. Visitamos a primeira cratera, que era enorme, subimos um pico, descemos para ver a cratera de outro ângulo e logo depois voltamos para a praia. Antes de voltar para o barco fizemos duas coisas.

Depois de muito esperar, a neblina se dissipou.


A primeira foi ver como aquelas montanhas eram recobertas por neve, e não por terra como parecia num primeiro momento. O fato é que aquele vulcão expelia cinzas e tudo isso se acumulou por cima de enormes montanhas de gelo. Em algumas partes era possível ver o gelo predominando.



A segunda coisa a ser feita foi nadar no mar do Sul. Esperávamos por isso há bastante tempo e fizemos. Todos correram para o mar apenas para entrar e sair. Entramos andando, bem tranquilos, depois nadamos um pouco adiante, voltamos nadando até que saímos do mar. Tudo registrado!


A água do mar é tão gelada que em poucos minutos, senão em apenas um minuto, já era difícil sentir os pés. Quando fiquei de pé para sair da água, pouco sentia o chão, agora, ao sair da água, parecia que estava quente. Sentimos a temperatura pela diferença e não em termos absolutos. Eu sabia que estava frio, embora não sentisse. Achei melhor me vestir assim que pudesse.

Mas para isso precisava das toalhas. As pessoas que iriam nos entregar as toalhas resolveram entrar na nossa brincadeira e não as entregaram por um tempo, até que se renderam e nos deram toalhas. Tive inclusive de pedir em hebraico! Depois de nos secarmos, nos vestimos, tomamos o bote e fomos para o navio. Lá nos esperavam um gole de rum e a sauna.



Ficamos uns vinte minutos reaquecendo até que nos preparamos para almoçar. Foi anunciado que o mar de tarde ficará novamente mexido e que deveríamos guardar nossos eletrônicos e aqueles que quisessem, podiam tomar as pílulas para enjoo. Não tive dúvidas, tomei as pílulas.

Data: 17/02/2015

sexta-feira, 6 de março de 2015

Cierva Cove e Mikkelsen Harbour

Depois do jantar a banda do barco tocou. Por banda do barco eu me refiro à banda formada pelas pessoas que trabalham no barco, todos filipinos. Além do show também foi feito um leilão para arrecadar fundos para a proteção da Águia das Filipinas, conhecida como Águias comedoras de macacos. O nome se deve ao fato de que macacos fazem parte da dieta destas enormes águias.



O show foi bem legal, diversas músicas de rock. Os garçons que ficam no bar, e obviamente já nos conhecem bem, se revezaram como vocalistas. Um fazia diversas piadas, por exemplo, dizendo que sabia onde "morávamos", enunciando nomes e cabines. O outro dançava mais em palco, um verdadeiro showman. Após diversas músicas a banda fez uma pausa para o leilão.



Um dos integrantes do grupo de especialistas da excursão fez uma introdução e começou o leilão de uma camisa do grupo. De cara um australiano cobriu os dois primeiros lances, a mesma pessoa. Neste momento o John entrou na brincadeira e cobriu o lance do australiano. Os dois começaram o duelo, no meio, um americano entrou com um lance maior que logo foi coberto. O americano desistiu do jogo e o John aumentou para 300 dólares o lance. Quando o australiano titubeava em fazer um novo lance, uma romena da plateia interveio e sugeriu que cada um dos dois doasse 200 dólares, assim se arrecadaria mais e ambos teriam sua camisa.

Assim ficou acertado e dois vencedores surgiram desta disputa. Depois de fotos a banda voltou a tocar, uma ou duas músicas depois o John foi chamado ao palco. Ele ficou um pouco reticente mas logo cedeu. Emendou Wonderwall do Oasis e todos no barco cantaram juntos. Foi uma noite incrível. Depois disto mais músicas, trenzinho passando pela varanda de trás, muito rock e cerveja.



Fizemos dois passeios, o primeiro, pela manhã foi uma volta com os botes para avistar animais. Pudemos ver diversas baleias bem de perto. Impressiona o tamanho delas e também como há todo um sistema em torno dela. Há pássaros que ficam por perto, às vezes pousam n'água e por outras vezes pousam nas próprias baleias.

O motivo é simples, elas querem o resto da comida que as baleias deixam escapar. Neste caso uma baleia ensinava ao seu filhote como se alimentar e alguns movimentos foram feitos fora d'água, o que nos permitiu ver o processo. As aves apenas esperavam algo escapar para ir lá comer. A associação com a política no Brasil me pareceu óbvia.

De tarde fomos ao Porto Mikkelsen, mas antes, fizemos um passeio de bote. O nosso piloto foi o Scott, um canadense, que é bem entusiasmado com a Antártica e a vida por aqui. Ficamos durante um bom tempo avistando focas leopardo, que são predadores ferozes, atacando inclusive focas.






Avistamos algumas descansando em Icebergs, mas duas outras nos seguiram durante um bom tempo. Elas acham que as bolhas dos motores são produzidas por pinguins.






Depois de um longo tempo atrás das focas, entre locais onde colônias de pinguins estavam estabelecidas, fomos visitar o local onde desembarcaríamos. Havia uma colônia de pinguins por lá, alguns restos de baleias, majoritariamente ossos antigos, e também os restos de um barco de madeira.





No local também havia um abrigo de emergência. Em alguns lugares que visitamos há estas cabanas que servem como refúgio caso haja problemas. Nesta colônia avistamos alguns filhotes de pinguim, alguns mudando de plumagem e algumas focas.







Data: 16/02/2015

segunda-feira, 2 de março de 2015

Petermann Island e Paradise Harbor

Depois de toda a festa de sexta, sábado foi um dia para dormir cedo e cedo foi a hora que acordamos no domingo. O dia começou às 6:00 com a chamada para acordar. Tomamos o café da manhã e aguardamos para fazer o passeio matinal. Como havíamos nos inscrito no passeio de bote que tomaria mais tempo, fomos os últimos convocados. O passeio foi muito legal, ventava muito e tomamos muita água no caminho. Especialmente eu que fiquei na parte frontal do bote, para ser preciso, no primeiro lugar disponível.
Isto não faz diferença numa viagem destas, estamos aqui porque gostamos de natureza e sabemos que um pouco de sujeira, no caso água, está envolvida no processo. No caminho passamos por alguns pinguins que estavam em cima de ilhotas, vimos uma baía formada por Icebergs. Acho que não me canso de ver estas enormes montanhas de gelo. Os formatos são os mais diversos, os tons de azul variam muito. É especialmente bonito quando a parte que está debaixo da água reflete o azul brilhantes que alguns nos mostram. O efeito que temos é que a água é azul ou que aquele gelo azul derreteu e está em forma líquida.




Depois deste passeio estendido de bote fomos ao local onde de fato observaríamos pinguins. Atracamos de maneira bem fácil, nas pedras. Antes de desembarcar vimos inscrito em uma pedra as letras PP, significando Pourquoi pas. Basicamente era a inscrição que os franceses fizeram ao chegar a este ponto, ou seja, por que não ficar aqui?


O plano era seguir para outro ponto onde atracaríamos, Gullet. Mas ventava tanto que os planos foram modificados. Ficou acertado que iríamos visitar a Paradise Bay, Baía Paraíso, onde fica a base Brown, dos argentinos.



Para se ter ideia do vento, de manhã cancelaram o passeio de caiaque por conta de 25 nós de vento, de tarde chegamos a 75 nós. Gosto das decisões tomadas porque deixam a segurança em primeiro lugar. Fomos almoçar e no fim do almoço percebemos que o barco estava fazendo uns barulhos diferentes. Fomos conferir e o capitão estava literalmente quebrando gelo!



Coloquei um tênis e um casaco e fui para a proa do navio, queria ver isto de perto. Fiz um vídeo no qual dá para notar o barulho do vento, o barulho do gelo sendo quebrado e uma risada minha, porque vi um cara imitando o filme Titanic, numa ventania indescritível. Ventava tanto que meu capuz saiu da cabeça e me puxou para trás. As pessoas se seguravam para não derraparem com a combinação de vento e chão molhado. Foi bem divertido.




O vento diminuiu bastante e com isso conseguimos chegar à Base Brown. Fizemos a nossa primeira visita ao continente propriamente dito. Este ponto, no entanto é bem polêmico. O continente é formado por diversas ilhas, durante o inverno muitas delas são conectadas pelo gelo, no verão nem todas. Dessa maneira, o que podemos considerar como sendo parte do continente?!


Eu fico mais feliz em saber que no verão a parte em que estive é conectada a todo o resto do continente, mas isso não seria uma condição determinante. O local que visitamos era diferente dos demais, pudemos subir até alcançar um pico e avistar a baía que se formava, tanto a parte em que ancoramos quanto a parte de trás. Vimos gelo despencar da montanha de trás, a princípio fiquei assustado com o barulho, mas depois de perceber que era bem distante, fiquei mesmo foi impressionado. Uma névoa recobria as montanhas ao fundo dando a impressão de que o topo das montanhas, recobertos por neve, emendasse com as nuvens, não se reparava bem o limite entre um e outro.




Para descer dessa íngrime subida utilizamos o tradicional esqui bunda. Uma "pista" havia sido criada e foi por ela que descemos. Para se ter ideia de como foi, tirei gelo inclusive do bolso da calça. Ter descido assim foi muito divertido, não só economizamos tempo como ficou marcado. No caminho para embarcar cruzamos com alguns pinguins. A ordem nestes casos é esperar o pinguim decidir por onde quer ir, passar e somente depois seguir.




Já na fila vimos uma funcionária da base argentina, conversamos com ela e descobrimos que há 13 bases argentinas na Antártica, das quais 6 são temporárias, sendo utilizadas apenas no verão. Interessante conversar com alguém que participa de um projeto científico por aqui.






Antes de voltar para o barco fizemos um passeio de bote, diversas pessoas da estrutura da excursão vieram em nosso barco, eram quatro no total, incluindo o médico e a fotógrafa. Avistamos diversos pássaros, focas leopardo - que é um dos principais predadores destes mares - pinguins e um barco a vela. O barco veio de Ushuaia, atravessou o canal de Drake e estava ancorado na parte de trás da Paradise Bay. Vieram sem utilizar o motor, somente a vela. Não sei até que ponto isto é verídico.



Durante o passeio pela parte de trás da baía começou a nevar e logo depois a chover. Sendo a Antártica um dos continentes mais secos do planeta, presenciamos um evento raro. A volta, já atrasados, foi em alta velocidade. Tudo o que a neve acumulada do esqui bunda, a neve neve dos céus e chuva não nos molhou, conseguimos na volta com o bote batendo nas ondas.


No "mud room", tirando as botas, achei gelo em outros lugares da minha roupa, como a dobra que eu fazia na parte inferior da calça, por exemplo. Rimos bastante disto, direto para o banho e depois janta. Hoje o jantar foi temático, América Latina. O Brasil foi representado pela moqueca.




Data: 15/02/2015