quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

O círculo polar antártico

Alcançamos o Círculo Polar Antártico à 00:30 do dia 14 de Fevereiro. Para esperar a travessia ficamos no bar conversando, não estávamos sós. Havia mais gente, mas não mais que dez pessoas. Quando se aproximou de fato o círculo, o líder da excursão fez o anúncio dizendo que em 30 minutos estaríamos cruzando o círculo. Desta maneira as pessoas foram chegando. Atravessamos o círculo, fizemos um brinde, fuzuê, tiramos fotos e as mesmas pessoas que chegaram minutos antes da travessia voltaram para dormir. Nós que já estávamos no bar, continuamos no bar.

Acho que tendo nascido numa cultura latina eu nunca vá entender este tipo de comportamento. Não era a passagem em si que precisava ser presenciada, todo um clima devia ter sido levado em conta e por isso ficamos acordados desde bem antes para a travessia. Na minha opinião é a maneira correta.

Fomos dormir aguardando conseguir aportar na Detaille Island e depois iríamos para Gullet. Às 5:30 recebemos o aviso pelo sistema de som que as condições não nos permitiriam aportar. Esta, inclusive, foi a razão pela qual os ingleses tiveram de abandonar esta base, a impossibilidade de se aproximar. 

O dia se resumiu a navegar para cima, voltamos por fora porque o mar estava muito revolto, com bastante vento. Isto mostrou que de fato todo dia em que faz sol devemos estar no deque, a qualquer minuto o tempo pode mudar completamente.

Um dia de navegação, balanço, descanso, palestras e muita comida. Já ignoro o fato de comer balançando, não tenho enjoos, não me afeta o apetite. Esperamos amanhã fazer novas visitas em terra, este é o plano que nos foi apresentado e as perspectivas são ótimas.

Fazemos parte de um grupo seleto de pessoas que chegaram tão ao sul, agora, pensando bem, será que valeria mais um dia de excursões ou será que não?!

Data: 14/02/2015

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Lemaire Channel e a busca pelo círculo polar Antártico, ou: Um dos dias mais deslumbrantes que já vi

Ontem foi dia de acampamento. As condições eram extremas, posso comparar com uma vez que acampei no deserto em Israel quando tinha por volta de 16 anos e com outra, também em Israel já em 2010. Em ambas tivemos o frio presente, mas dessa vez foi na Antártica! Mesmo sendo verão, foi na Antártica!

O Canal Lemaire foi uma das paisagens mais deslumbrantes que vimos por lá. O dia também ajudou bastante.
Depois do jantar aguardamos instruções. O primeiro ponto que havia sido escolhido para a atividade estava bloqueado por um Iceberg. Por isso o capitão foi em busca do segundo ponto. O local ficava numa baía, protegida de certa maneira dos ventos. Perto da gente uma colônia de pinguins, um pouco de barulho e movimentação deles.

Antes de embarcar nos deram um saco de dormir para cada e uma sacola com as barracas, colchões isolantes e as travas para fixar a barraca no chão. De lá fomos para o Mud Room onde calçamos as botas, fizemos a assepsia das mesmas e embarcamos nos botes. O caminho foi rápido, com um pouco de vento, mas nada desesperador.

Ao chegar ao acampamento recebemos algumas instruções e fomos montar a tenda onde dormiríamos. Olhamos aqui e acolá e sem grandes dificuldades conseguimos deixar a primeira parte como deveria ser. Pedimos orientação e conseguimos colocar a parte externa da tenda conectada à primeira. Fizemos uma proteção de neve ao redor da barraca para evitar a entrada de vento. Para finalizar o John resolveu prender a bandeira do Flamengo. Eu não me opus.

O reflexo nas barracas foi provocado pela minha lanterna estilo mineiro, utilizada na cabeça.
Terminada a parte externa, posicionamos os colchões isolantes e os sacos de dormir. Liguei o som do lado de fora da barraca enquanto aguardava os outros terminarem. Pouco tempo depois a escuridão tomava conta do lugar. Ver o barco aceso de outra perspectiva me fez notar que aquela noite seria dormida na Antártida, era uma ilha, mesmo assim, em latitudes baixas.

Depois de montar a tenda onde dormiríamos.
O local escolhido para acampar ficava bem próximo a uma colônia de pinguins. Escutávamos eles se comunicando, andando, o vento passar e até alguns deslizamentos de neve que aconteciam no outro lado da baía.

O navio ao fundo à direita.
A noite foi fria, especialmente porque o isolante térmico não funcionou como esperávamos. De todos os modos foi uma noite curta, dormimos de 1 da manhã às 5. Acordamos rápido e desmontamos tudo, o mais rápido possível. Nossa ideia era estar no primeiro bote para a volta. E conseguímos. Assim que chegamos no barco fomos recebidos com chocolate quente. Isso foi muito legal, imagine que ainda percorremos o trecho até o barco recebendo vento. Uma caneca de chocolate quente fez muita diferença e deixou a todos muito felizes. É esse tipo de cuidado que faz a diferença numa viagem, fica marcado.

Voltamos para o quarto aguardando o café da manhã. No café vi o grupo de inglesas que havia acampado perto da gente tomando champagne. Fui até a mesa delas e parabenizei, mesmo sem saber o motivo da comemoração. Elas me falaram o óbvio: conseguiram acampar. Muito legal comemorar este tipo de coisa, às vezes não notamos que alcançamos objetivos próprios e comemorar ajuda muito a estabelecer estas marcas.

O dia é de travessia por canais visando a alcançar o Círculo Polar Antártico. Atravessamos um canal chamado Lamaire, que é lindo. Montanhas de gelos por todos os lados, Icebergs, pinguins, baleias, focas de diversos tipos. É indescritível e por mais que eu tente traduzir em palavras a grandeza e variedade que estou vendo é pouco.

Montanhas de neve no Canal Lemaire.
Do outro lado podíamos avistar enormes Icebergs.
Tem ventado muito hoje e mesmo assim os deques estão lotados de pessoas. A gente se tapa em todos os lugares, mesmo assim o vento acha espaços vazios. A parte da frente é sempre a mais sacrificada. Independentemente do andar em que estamos, mesmo assim, lá ficamos. 

Um Iceberg no meio da paisagem. Descendo o canal rumo ao sul passamos mais perto a bombordo (esquerda olhando-se para a frente - proa - do navio). As montanhas deste lado tinham mais rochas aparentes.
Durante todo o o dia anúncios são feitos pelo sistema de rádio, ora dando informações sobre detalhes ora dando informações sobre o que acontece lá fora, por exemplo, onde avistaram uma baleia, onde há Icebergs, o nome do canal, figuras históricas que por aqui passaram. E também nos informam sobre regalias, por exemplo, durante o dia ventou muito e nos ofereceram, novamente, chocolate quente, desta vez com um licor. Foi muito bem vindo e estendeu o período de contemplação.

Depois de passarmos por um estreito.
De tarde, quando ventava bem menos, nos ofereceram sorvete. Fui direto da academia e causei espanto porque estava de camiseta e bermuda. Foi engraçado.

Detalhe das montanhas recobertas por neve.


Hoje o dia foi todo de navegação já que todos no barco querem alcançar o círculo, ainda temos outra expectativa, basicamente botar os pés no continente propriamente dito. Vamos ter de aguardar.

Uma cadeia de montanhas a estibordo (direita).
E Icebergs do mesmo lado.
PS: Uma das integrantes do grupo de suporte tinha um nome que me soou israelense, fui perguntar a origem do nome e confirmei minhas suspeitas. Conversei com ela em hebraico, ela me contou que havia trabalhado por 27 anos num banco lá em Israel, até que depois de uma viagem se mudou para o Canadá e mudou de vida. Ela ainda tem três filhas em Israel, mas vive nestas excursões.
Nem na Antártica é fácil olhar contra a luz do sol.

Data: 13/02/2015

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Cheguei à Antártica!

Sempre depois do jantar tem show com um músico no barco. Ele é nascido no Zimbabwe, curiosamente não é a primeira pessoas de lá que eu conheço. O show ontem teve diversas músicas conhecidas, várias delas eram do estilo rock inglês. Foi muito legal, as pessoas não estavam tão animadas quanto o John e eu. Mas foi legal, o músico interagiu conosco, o garçom interagiu e a gerente do hotel ficou de papo.

Avistando terra.
Tem gente de diversos lugares do mundo aqui, embora a grande maioria seja de australianos, seguidos de ingleses e depois americanos. Pela manhã notei no mapa que estávamos bem perto de ver alguma terra. O plano inicial era ir para o círculo polar antártico e depois subir. Tivemos de mudar um pouco o trajeto. O primeiro ponto que avistamos foram as ilhas Melchior, depois de descer pelas ilhas Shetland. No caminho muitos animais já apareceram: albatrozes, petreis, pinguins, focas e baleias.

Quando chegamos bem perto da terra ancoramos. Descemos para o "Mud Room" (quarto da lama) que é o ponto de desembarque e embarque para as operações (atividades externas). A ideia é ter duas destas por dia. Já na primeira saída demos uma bela volta pela baía onde ficam as ilhas.

"Mud room"
Primeira saída ao mar.
Uma baleia passou muito perto da gente, fiz um vídeo muito legal. É realmente incrível ter animais tão grandes por perto, duas sensações me passaram na hora: entusiasmo e apreensão. A natureza impressiona de todas as maneiras aqui, os animais, o clima, as montanhas, os icebergs. Tudo é muito diferente do que já vi até hoje.

A paisagem apresentava mudanças. Uma constante era a variação do clima. No mesmo dia pegamos sol, chuva, neve e névoa.
Uma baleia ao lado de um bote.
Depois de avistar a baleia vimos pinguins, focas, todos na costa. Os icebergs são lindos, assim como o gelo que fica nas montanhas. Os tons variam em branco e chegam ao azul. O azul é bem bonito, gosto muito desta tonalidade. Vimos formações incríveis. Elas me impressionam muito. Depois demos a volta para chegar ao navio. O passeio durou mais de 1 hora.

Diversas fendas se forma e é possível notar que a neve se acumula em camadas.
Detalhe de um ponto de descolamento.
Formações impressionantes na neve.
Por diversos momentos no caminho vimos animais, pinguins e focas que pulavam. Baleias jogavam jatos para cima e pássaros nos circundavam. Icebergs por todos os lados. Às vezes vento, às vezes neve. Quando apenas nevava era bem tranquilo, a temperatura era completamente suportável, já quando ventava, ou ventava e chovia ou mesmo ventava e nevava, a coisa mudava. É nessas horas que o frio pega, mas dá para aguentar.


Algumas focas numa ilha.
Depois da volta almoçamos e aguardamos a segunda partida. Nessa a gente desembarcou na Roger Island, havia duas colônias de pinguins, das quais pudemos visitar uma apenas, que estava na parte baixa da ilha.

A conquista do cume.
Os pinguins da colônia baixa eram os Adelie, a da parte alta era o Chinstrap (corda no queixo, em tradução livre). Os pinguins fazem caminhos (highways) e os seguem para facilitar o deslocamento. É incrível como a ilha tem cheiro de excremento, mesmo assim, a beleza não nos deixa prestar atenção nisto.

Pinguim Gentoo em detalhe.
Do ponto em que estávamos podíamos ver o nosso navio, o continente antártico propriamente dito, diversos icebergs, um outro navio e gelo por todos os lados. Os tamanhos e as cores se tornam dramáticos aqui. Não é uma sensação criada, como aquela que senti ao visitar Jerusalém com 16 anos de idade, pelo contrário, não há uma expectativa religiosa, você pensa que vai ser bem legal visitar o continente do sul, mas quando chega-se aqui, diante da imensidão e do poder da natureza, você se rende.

Enquanto alguns pinguins se distraem ao sol...
...outros parecem ter gostado do nosso navio.
Não há como não se sentir parte da natureza, não há como se achar mais importante que qualquer outra espécie de nosso planeta. Ao mesmo tempo que me veio a sensação de deslumbramento, fiquei pensando em como podemos estar estragando o planeta como um todo. Ele sobreviverá, ele encontrará outro equilíbrio, mas e a gente?

O tamanho da montanha em comparação a um bote.
O pôr-do-sol na praia frequentada pelos pinguins.
Hoje a noite iremos acampar, estamos todos ansiosos para saber como vai ser dormir em terra firme depois da travessia. Como será o frio, como beberemos água. Diversos pensamentos me chegam, mas acredito que será uma noite bem legal.

PS: Até agora não falei da comida do navio, que é boa e farta, o que é bem importante dentro do meu conceito de gastronomia. Mas hoje a menção vem por conta da carne de cervo que nos serviram. Tenra, de gosto acentuado, sem sobrepujar os demais sabores. Recomendo.

Data: 12/02/2015

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

O segundo dia no mar - O término da passagem pelo Drake

Depois do jantar tomamos banho e fomos jogar dardo. O bar estava pouco movimentado e acabamos não pegando nada do show que o músico normalmente faz. O barco estava todo vazio e ficamos andando por ele durante um tempo, tomamos um chá e fomos para o quarto. Há muita gente mais velha aqui, talvez o preço da viagem não atraia tantos jovens.

A idade não é impeditivo. Vi senhoras de idade caindo no deque e levantando serelepes. Definitivamente a idade é algo que se constroi na cabeça, obviamente precisamos manter o corpo ativo e para isso exercícios são bons. Mas o tempo cronológico pode ser sentido menos com atividades que nos desafiem. Vi aqui bons exemplos de pessoas de idade desafiando-se e fazendo coisas que pensamos ser para os jovens.

Eu venho acompanhando a viagem por um aplicativo de celular bem interessante. Chama-se Trilhas e é do Google. Ele marca a posição GPS no mapa e coleta estatísticas. Eu já o utilizo constantemente para fazer trilhas, utilizei nas três que fizemos em Ushuaia. Notei que ganhamos muito tempo hoje e possivelmente vamos ver as ilhas da Península Antártica ou o próprio continente. De manha, por volta de 7:30 passamos a latitude 60º que indica o limite geográfico da Antártica. Não sei ainda a que horas chegamos à Zona de Convergência, que é o ponto onde as águas do Sul, mais frias, encontram as águas do norte. Isto é tema de um concurso que fizeram por aqui. Os outros dois são, que horas veremos a primeira geleira e que horas veremos a primeira baleia.

Utilização de mapas ao lado de equipamento moderno.
Detalhes dos instrumentos modernos na cabine.
Se notarem verão que voltei a utilizar Antártica. Aprendi aqui que Antártico é um adjetivo que foi inventado bem antes de se saber a existência de algum continente. Basicamente a palavra é a junção de duas outras: anti e ártico. A ideia é um conceito grego de que tudo tem um oposto, e no caso desta região é óbvio que a oposição é ao Ártico, ou seja, norte do planeta.

Visão de mais equipamentos.
Quadro de avisos e relógio.
De manhã tivemos instruções gerais de como devemos nos comportar na Antártida. Há uma convenção que deve ser respeitada, a de Kyoto 1994, além de regras estabelecidas pela associação de operadores de turismo por aqui (International Association of Antartica Tour Operatours). Essa associação é tão forte que diversas recomendações de preservação são estabelecidas por eles e seguidas por diversas outras entidades.

Também recebemos instruções de como nos portarmos nos barcos que nos levarão até ao continente em si. O nome destes botes é Zodiac (zodíaco), achei o nome estranho, mas é a marca deles. Outra atividade que fizemos foi sanitizar as botas que utilizaremos e todas as roupas que poderão entrar em contato com o continente. Achei muito legal esse interesse em preservar o ambiente da maneira mais isolada de contaminação externa possível.

A vista posterior do barco. No andar debaixo fica o bar, no de cima apenas um deque de observação.
De tarde tivemos duas outras palestras, uma sobre pinguins, com diversas fotos e outra sobre as mulheres na Antártida. É impressionante como até pouco tempo atrás o preconceito era enorme e que a elas sequer dirigir não era permitido. Isto ocorreu até meados dos anos 70. Como ainda somos atrasados. 

Por volta de 18:45 teremos instruções sobre o nosso dia de amanhã. Estou achando que vamos ter alguma surpresa de noite, tendo em vista a posição que estamos no mapa. Agora é aguardar um pouco e já ir preparado para possíveis fotografias.

O pôr-do-sol no sul.
PS: Não posso deixar de citar que utilizei a academia do navio hoje, malhar nas ondas indo de lá para cá é uma tarefa diferente. Mas devo ter sido um dos poucos a ter feito isto nas águas do sul. 

Outra curiosidade é que o mar está calmo, pelo que falou a gerente do hotel que faz esse trajeto algumas vezes por ano, e já balança bastante. Ela classificou que numa escala até 10 nosso nível de balanço é 2. Imagine subir um pouco mais na escala.

Data: 11/02/2014

domingo, 22 de fevereiro de 2015

O primeiro dia no mar - Início da Passagem pelo Drake

Ficamos bastante entusiasmados de poder seguir viagem. Algumas coisas ficaram esclarecidas assim que entramos no barco. A primeira foi a tentativa de fazer jus ao nome da excursão, Quest for the circle, em tradução livre A busca pelo Círculo Polar Antártico. Poucas pessoas chegaram a latitude tão alta no hemisfério sul e isso é um objetivo incrível de se cumprir.

M/S Expedition
Outra coisa que nos ficou esclarecido é que tentaríamos manter a programação original apesar da perda de tempo ocasionada pelo reparo no motor. Ficamos sabendo que uma operação toda foi montada, peças e engenheiros vieram da Europa, mecânicos da Argentina foram deslocados para o reparo, o navio teve de ser reabastecido em menos tempo, a programação teve de ser revista, bem como a rota.

No final tivemos as boas vindas, instruções de segurança, visitamos diversas partes do navio, nos serviram o jantar e nos deixaram livres. A manhã seguinte prometia bastante coisa.

Instruções de salvamento
De acordo com a rota inicial tínhamos dois dias atravessando a Passagem de Drake e até agora cumprimos um dia em mar. No entanto o mau tempo nos fez mudar o plano modificado, que era descer diretamente para o círculo polar antártico. A segurança vem antes de tudo e nisto estou de acordo com todo o pessoal que decide a viagem. Não podemos nos lançar numa aventura irresponsável.



Para não arriscar, assim que nos ofereceram remédios para enjoo eu tomei. O barco inicialmente estava bastante estável, mas bastou sair do Canal de Beagle para ver como seria a travessia até a convergência, ponto onde os mares se encontram.

Notem que embora o horizonte esteja bem inclinado, deveria estar mais, já que não consegui deixar a câmera completamente alinhada com o barco.

Desde a madrugada o barco balança. As refeições são feitas com o balanço, tudo é preso ao chão, desde a cadeira até uma estratégia que se utiliza para que os copos não escorreguem. Uma espécie de toalha bem fina de borracha é utilizada. Embora os copos não escorreguem, eles viram com o balanço, e não é incomum ver o chão molhado.

A cadeira presa ao chão.
Durante o dia algumas palestras aconteceram: Como observar pássaros em alto mar, A disputa pela conquista do Pólo Sul, Conhecendo a Antártida e Como tirar boas fotos. As quatro palestras foram interessantes. Devo admitir que pássaros não são objeto de grande interesse de minha parte, embora admire alguns dados sobre eles, como saber que o albatroz pode percorrer até 1000 Km por dia, ou 8000 Km em uma semana para obter de 1 a 2 Kg de alimento. Ou então saber que não precisam voltar à terra para nada, nem mesmo para beber água.

Mesmo assim, com tanta formação interessante, ainda fiquei mais interessado quando uma animação mostrou o deslocamento das massas que formavam a Gandwana (último macro-continente que existiu) até a forma atual. Ou então saber como as correntes marinhas se deslocam e provocam diversos efeitos no planeta.

A história da conquista do Pólo Sul também é bem interessante. Estou tentando terminar o livro do Amundsen, que foi o primeiro homem a chegar ao último local onde o homem não havia estado, e muita nova informação foi adicionada pela palestra.

As boas vindas do capitão Nesterov. Ele falou que nosso navio é uma expedição, os grandes, hoteis.
Uma coisa muito legal de se fazer aqui é conversar com as pessoas que trabalham nesta expedição. Elas trazem histórias de vida completamente diferentes, mas parecem compartilhar todas um mesmo entusiasmo. Por exemplo, a gerente do hotel do navio é brasileira. A fotógrafa, uma inglesa, é engenheira eletrônica, e assim você conhece pessoas das mais diversas origens, com formação nem sempre relacionada diretamente ao papel que exercem hoje. Mais uma vez, isto corrobora a ideia de que nos adaptamos.

Vista desde a cabina de comando (bridge)
Notem a bandeira depois da janela.
O clima ainda não é extremo e possivelmente não ficará. Estamos no verão e quando não venta a temperatura é perfeitamente tolerável. Aguardamos, ainda ansiosos, pela evolução do dia de amanhã. Tanto com respeito ao clima que pode nos ajudar quanto com relação à velocidade que podemos alcançar. Assim saberemos quando finalmente veremos terra.

Data: 10/02/2015

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Navegando pelo Canal de Beagle e visita à Estância Harberton

Ainda esperando pelo navio fizemos dois passeios que nos foram oferecidos. Navegamos pelo canal de Beagle e depois seguimos para a Estância Harberton.

O passeio começou bem cedo, no porto de Ushuaia. Lá tomamos o catamarã que percorre o canal de Beagle. Passamos por algumas ilhas onde avistamos animais, na primeira vimos diversos pinguins. Eram três espécies, uma delas era o King Penguin, as outras duas eram a "Magellanic" e "Papua". Aquela era a mais bonita, tinha uns detalhes laranjas que compunham muito bem com o preto e branco do resto do corpo. Acho que esta espécie é a que mais aparece em filmes de animação.

King Penguin
O cheiro de peixe no local era bem evidente, decorrente da dieta das aves. Quando os pinguins andavam, pareciam desajeitados, mas bastava mergulharem para ver que eles tinham extremo domínio dos próprios corpos. Nadavam com tamamha destreza que mesmo de cima, pela água, conseguíamos ver manobras ousadas. Mudavam de direção com uma facilidade incrível. 

Colônia de Pinguins no canal de Beagle
Os pinguins vistos de perto são bem interessantes, especialmente o King Penguin. Fiquei muito impressionado, embora biologia não seja a minha ciência predileta. A próxima parada foi numa ilha com leões marinhos. Eu já havia visto estes animais em São Francisco. Aqui no hemisfério sul eles pareciam menores, mas do cheiro eu me lembrava muito bem, assim como os grunhidos.

Leões marinhos
Eles se chamam, sabem onde ficar e a quem obedecer. Alguns tinham marcas de mordidas, as lutas deles são ferozes. Não vimos nada parecido com isto, apenas alguns animais correndo para lá ou para cá, escorregando das pedras.

No caminho vimos ainda um farol e outras ilhotas mais. Chegamos à Estância Harberton. Ela foi fundada por um missionário inglês que se estabeleceu aqui em 1870. Foi uma das tentativas de colonizar a região. O contato com os índios os extinguiu, não apenas pelo contato com este missionário, mas com os europeus de um modo geral.

Farol no Canal de Beagle
Passamos pela casa que foi a primeira construção na Tierra del Fuego. A quarta geração ainda mora no mesmo local. Talvez esta seja a última geração que morará por aqui, a não ser que as próximas desenvolvam atividades ligadas ao campo. Cada vez mais as atividades econômicas deixam de ser realizadas por indivíduos, a tendência é que empresas exerçam esta função. Os filhos e netos do atual proprietário já moram em cidades e provavelmente tem profissões que não são diretamente ligadas ao campo.

A descarga da produção.
Há ainda alguma plantação na propriedades, para consumo próprio. O cheiro dos morangos era incrível, doce mas sem ser enjoativo. Fiquei triste de não conseguir registrar o cheiro para trazer comigo. Fiz questão de na saída passar novamente no campo para sentir aquele aroma inigualável. Batatas, framboesas e outras coisas eram cultivadas por lá.

Na horta o cheiro de morangos era incrível.
Visitamos também a produção de lã, já desativada, e o museu de biologia. A maior coleção do mundo de ossos de cetáceos se encontrava aqui quando a esposa do atual proprietário foi visitada por professores universitários americanos. Estes ficaram impressionados com a qualidade e quantidade e isto estimulou a criação do museu. O fato curioso é que os ossos não foram conseguidos por caça, mas trazidos pelas correntes marinhas, em carcaças ou já soltos.

A volta era de grande expectativa já que receberíamos a notícia sobre o prosseguimento ou não de nossa viagem. Embarcamos todos curiosos no barco e recebemos a notícia positiva. Passamos pelo treinamento de emergência, conversamos um pouco com representantes da empresa responsável pelo passeio, com o pessoal que nos atende no hotel e bar e agora aguardamos a chegada à passagem de Drake.

Ali o encontro de dois mares, o Atlântico e o Antártico promete águas turbulentas. Diferença no nível dos mares, sanilidade e outras mais marcam os dois corpos d´água. Já nos preparamos tomando um remédio para enjoo e planejamos ir para o deque nesta hora.

Data: 09/02/2015

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Presídio e Parque Nacional

Ontem de noite resolvemos provar todos os rótulos argentinos de cerveja artesanal que encontrássemos. Provamos um monte delas, algumas muito boas. Fizemos isto depois de jantar, podem ficar tranquilos! Ainda comemos alguns quitutes no bar, tudo sob controle ; )

Acordamos cedo hoje, tínhamos de fazer o check out e entregar nossa mala, já que iam nos mudar de hotel. Aproveitamos a manhã livre para visitar o complexo prisional, já desativado. Boa parte dos países no mundo criaram este tipo de instituição em locais isolados. No Rio fizemos na Ilha Grande, ainda aguardo explicações plausíveis para a escolha do local.

Aqui na Argentina construíram este complexo em Ushuaia, sem antes terem tentado estabelecê-lo na Ilha dos Estados. Tanto lá quanto em Ushuaia as condições eram péssimas, sendo que naquele o vento era inclemente o que levou a mudança da prisão para esta cidade.

Visitamos também uma réplica do chamado Farol do Fim do Mundo, que se localizava na mesma Ilha do Estado. Bem interessante o sistema de sinalização, tendo que levar em conta ventos vindos de todos os lados.

Voltamos para a parte principal da cidade e fomos comer numa casa de frutos do mar. Escolhi a truta à moda da Terra do Fogo, com queijo e tomate. Estava gostosa, pouca espinha. Tinha tempo que não comia truta, logo me lembrei de uma época em que comprávamos truta congelada lá em casa. Meu pai preparava com um molho de mostarda que ele inventou, levava requeijão e mostarda. Fiquei com vontade de comer mais truta.

De tarde fomos com o grupo da excursão ao Parque Nacional. O mais interessante foi aprender sobre os Yamanas, população autóctone que provavelmente chegou às Américas vindo da Ásia, possivelmente da Polinésia ou Micronésia.

O que mais chamou a atenção dos europeus, e também a minha, foi saber que eles viviam sem utilizar vestimenta alguma. Há algumas teorias para isto, uma era que eles haveriam desenvolvido, geração após geração, uma região abdominal maior que reteria mais comida ajudando assim a isolar o frio. A outra citava uma técnica de passar gordura de foca ou leão marinho no corpo, criando uma capa protetora. Outro ponto relevante é que eles sempre tinham uma fogueira perto deles, este fato deu nome à Terra do Fogo. 

O fim do mundo?!
O fato é que os seres humanos conseguem se adaptar a muita coisa, a climas extremos mesmo sem muitos recursos. E basta lembrar disto para saber que podemos nos mover de nossa zona de conforto. 

No Parque Nacional visitamos o posto de correio mais austral da Argentina. Carimbei meu passaporte e mandei um postal para mim mesmo! Os conselhos do Daniel do passado para o Daniel do futuro. Espero não mudar de ideia até lá!

Correio do fim do mundo.
Amanhã o dia deve ser cheio. Temos uma visita ao Canal de Beagle, a ilhas com pinguins e visitaremos a primeira estância estabelecida por essa região.

Data: 08/02/2015


domingo, 8 de fevereiro de 2015

Glaciar Vinciguerra

Fizemos mais um trekking, dessa vez pesado, mas em condições climáticas adversas. Se nos outros dias fizemos quase 10 Km, hoje passamos dos 11 Km. Além disso a chuva nos acompanhou por boa parte do perscurso, mas a chuva não é o que mais incomoda. O vento é o pior companheiro de caminhadas no frio. Ele faz com que a sensação térmica seja menor. Começamos a caminhada a 8º C, mas estimo que chegamos bem perto de 0º C.

O início da caminhada foi leve, mas o início durou pouco, logo estávamos no bosque em subida íngrime. Essa parte exigia do preparo, as subidas eram bem acentuadas e algumas partes estavam escorregadias por conta da chuva. De uma maneira geral estávamos protegidos pela copa das árvores e também pouco vento entrava na floresta. Aos poucos o corpo aqueceu e fomos tirando as camadas de roupa.

O começo do passeio.
Antes da caminhada, regulando a temperatura do corpo sem casaco.
Essa parte durou pouco mais de uma hora, cansativa porém administrável. Depois chegamos a uma cascata onde fizemos uma pequena parada para comer e descansar. Dali tínhamos um descampado pela frente. O guia que nos conduziu foi o mesmo que nos levou à Laguna Esmeralda. Quando o vi vestindo roupa percebi que seria bem frio lá em cima.

Cascata.
Continuamos a caminhar cruzando um riacho e chegando em nova subida acentuada. A esta altura o vento cortava bem forte, tive de parar para colocar o resto dos casacos. O frio era tão intenso que perdi o tato. Fiquei preocupado, parei de me vestir no meio do processo para aquecer as mãos. Subi uma parte com elas protegidas dentro do casaco. A minha ideia era aquecer o corpo e por consequência as mãos. O plano deu certo e continuei a me vestir. O resto do percurso foi feito sob forte vento.

Mais uma vez a chegada nos recompensou. Avistamos uma geleira derretando desaguando em um lago bem bonito. Fizemos uma parada ali para comer, enquanto conversávamos. Este grupo tinha 3 argentinos e 10 brasileiros. Era um grupo bem divertido, as pessoas estavam gostando do passeio mesmo naquele clima, o que me deixou bastante satisfeito. 

O Glaciar Vinciguerra e o lago que se forma pelo seu derretimento.
Saber que há pais e filhos se divertindo juntos, jovens casais, amigos, todos num passeio na natureza é algo que me alegra. O contato que perdemos com a natureza tem de ser reavivado, ele nos mostra o que somos de verdade. Eles mostram que embora tenhamos nos afastado dela, o retorno sempre é possível e ela sempre nos retribuirá.

A chegada foi com neblina, chuva e vento.
Contemplamos a geleira e o lago apesar do frio e da chuva. Dali demos a volta no lago e encontramos algumas cavernas de gelo, entramos numa delas. A entrada era por uma pedra, o que causou um estrago. Eu escorreguei e consegui sujar completamente meu casaco branco. Aliás, somente uma menina conseguiu sair ilesa da lama, todos se sujaram de uma maneira ou outra.

A volta foi bem mais rápida, descer não cansa, apenas machuca os joelhos. Mas o frio era tão intenso que a dor era completamente secundária. Além disso estávamos bem ansiosos para chegar ao hotel e ter notícias do nosso embarque. Por ora a posição se mantém, temos 12 horas de atraso. Novas informações virão quando o barco finalmente chegar à Ushuaia.

Para comemorar mais uma caminhada temos o plano de comer um cordeiro patagônico e tomar umas cervejas. É importante comemorar conquistas!

Data: 07/02/2015